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Uma infância e Três Cobertores

Uma infância e três cobertores - a importância dos avós, constelação familiar

Uma infância e três cobertores – A importância dos Avós

Eu tinha três, fiquei com 2 e hoje não tenho nenhum, mas tenho muito mais.

Desde pequena eu tinha 3 cobertores dados pelas minhas avós. Um era de crochê preto, de flores, um marronzinho e um laranja. Além de friorenta, sempre fui muito apegada a eles.
O de crochê quem me deu foi minha avó materna e os outros minha avó paterna.

Minha avó paterna morreu quando eu tinha 12 anos e realmente foi uma data que marcou muito minha vida.
Ela era doce, paciente, acolhedora, amorosa e muitas outras qualidades que nem lembro para descrever. Claro que também já vi ela brava, mas não é uma memória forte.

Lembro muito da minha infância na cada dela, nas viagens com ela, nós duas nos ônibus.

Ela cozinha, passava roupa numa mesa na cozinha, costurava, me lembro de pijamas que ela fazia, acho que de flanela.

Enfim, votando para o cobertor marronzinho que não me lembro quando ganhei, mas me lembro de tirarem de um porta malas do carro e a que foi a vó Nair que mandou.

Um serviço que sempre existiu

Talvez ela tenha comprado em uma de suas viagens ou pedido para seu Zé comprar e levar lá em casa. Seu Zé era o taxista conhecido que fazia compras para minha avó, tipo Rappi/Uber de hoje (risos).

Lembro de ficar tão feliz com o cobertor marronzinho, era macio, quentinho, acolhedor.

Já o cobertor laranja, ah o laranja, deu muita briga na minha casa (risos). Ele é o marco da minha rebeldia. (mais risos).

Na época que ganhei o laranja, meus pais já tinham se separado e minha avó perguntou o que eu queria ganhar de presente, não lembro se aniversário, dia as crianças ou Natal. Só lembro da minha mãe falando para eu pedir uma televisão igual meus irmãos, para eu largar de ser boba. Eu como criança, lembro de ter ficado triste, incomodada com minha mãe, pelo tom de cobrança, dor, competição. Claro que hoje tenho compreensão e aqui não cabe julgamento do que ela fez.

Quando fui falar para minha avó, não pedi nada, apenas disse para ela me dar o que quisesse.

Nem toda lembrança é uma verdade absoluta

Não me lembro porque não pedi boneca ou algum outro brinquedo, até a própria televisão. Apenas segui meu coração e fiz o que achei certo. Talvez tenha julgado minha mãe e quisesse contrariá-la, talvez apenas quisesse me fazer de boazinha ou talvez estivesse evitando mais brigas entre as famílias. E talvez tudo junto e misturado. Resumindo, só sei que ganhei o cobertor laranja e amei. É um laranja vivo, alegre!

Bom ao longo dos anos, o pretinho de crochê rasgou e me desfiz dele, já o marronzinho e laranja continuei usando muito e muito, até a rinite do meu filho e marido não permitirem mais. Então foram ficando bem velhinhos e com a chegada dos edredons, acabaram indo para o armário. Com todo cuidado eu os lavava e cuidava, colocava no sol, tudo cheio de dedos.

Por mais que não fosse apegada as coisas materiais e muito menos nostálgica, não conseguia doar os cobertores. Claramente eles tinham muito valor para mim e também um apego exagerado (risos).


Cobertor é o aconchego da vó.


Ah, como senti falta da Avó todos esses anos. Como fiquei apegada a sua falta, a dor da partida e aos cobertores que me dera.

A cada ano ia me desapegando aos poucos, mas nunca chegava a tomar ação de doá-los.

Quando meu filho fez 7 ou 8 anos, minha prima ia casar e minha família de Jaboticabal (família da avó) veio para o casamento e ficou para o aniversário do meu filho, e isso me trouxe muito acolhimento e lembrança da vó e sua falta. Lembro de chorar muito no final da festa e sentir sua falta, seu aconchego, sua amorosidade e tudo mais que ela me passou.
Continuei trabalhando em mim tudo isso.

Antes, ao olhar para os cobertores eu chorava e aos poucos, com o tempo (percebeu que foram muitos anos? risos) fui soltando e agradecendo.

A cada dia um soltar, um agradecimento, sem dor, sem apego, mas com uma gratidão sem tamanho, que me fez escrever este texto e cá estou contando essa história, que nem sei se está fazendo sentido para você, mas eu precisava disso.

Que honra conviver com meus avós, que honra ter o carinho deles fisicamente por um bom tempo na minha vida, que honra ser acolhida por braços e cobertores, mas é preciso ficar velho para a existência do novo. É preciso liberar espaço para o novo.

Um dia serei avó e poderei dar este acolhimento e claro um cobertor (risos), mas isso só é possível porque me permito ficar “velha”, assim como os meus ficaram e deram espaço para os netos, os novos e hoje tenho a honra de seguir com a vida.

Espero que meu filho siga com sua vida, cheia de vida e gerando vidas.

As memórias já não são tão vívidas, mas o amor, ah o amor, esse mora dentro de mim, assim como cada um dos meus ancestrais, que hoje posso dizer com o coração aberto, pulsante, gigante: OBRIGADA! Quanta gratidão a tudo e por tudo!


Muito amor por cada cobertor!

Hoje 18 de outubro de 2021, após 33 anos eu me despeço dos cobertores que acolheram a minha vida e trouxeram tanto amor em cada fibra. Sigam acolhendo do jeito que for, porque sempre existirá amor.

Cada um tem seu tempo e as vezes a cura plena demora mais do que o esperado, mas o importante é seguir fazendo o seu melhor, pois assim os seus o fizeram, um pouquinho todo dia, todo dia um pouquinho.

Nas constelações familiares observamos o quanto os avós trazem harmonia para o sistema e também o quanto muitas vezes estamos emaranhados. Se colocar como observador ajuda no caminhar.

Cheia de amor e muito aquecida.

Danielle Bento

Neste vídeo eu conto mais…

https://revistastatto.com.br/bem-estar/razoes-de-viver/uma-infancia-e-tres-cobertores-a-importancia-dos-avos/
Texto saiu no site da Revista Statto

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